quarta-feira, dezembro 17, 2008

«O homem é um lobo para o homem»


«O homem é um lobo para o homem[1]»

Sem querer ser como o nosso “Velho do Restelo”, tenho que reconhecer que o homem hodierno se encontra perdido de si mesmo e em si mesmo. O caminho presente e futuro tem que passar, necessariamente, pelo desenvolvimento de uma base moral. Uma sociedade que se degrade moralmente, sepulta-se. Há que formar a pessoa para discernir o que é o bem e o que é o mal; que se apoie no progresso humano e científico, mas que não se entregue à cultura da vida fácil, enveredando por caminhos do prazer sem limites.

Segundo Henrique Rojas, o homem actual é um homem “light”: «É um homem frio, que não crê em quase nada; as suas opiniões mudam rapidamente e vive afastado dos valores transcendentes». Esta é razão pela qual ele se torna cada vez mais vulnerável. Por outras palavras, este homem caiu numa certa incapacidade de defesa. Deste modo, este homem é facilmente manipulável. O consumismo, tendo em si uma forte raiz na publicidade massiva e na oferta bombardeante, cria em nós falsas necessidades. E para este homem vulnerável, tudo é necessário. Aliás, falsas necessidades.

Hoje somos convidados a mudar de rumo. Caso contrário, corremos o perigo de iniciarmos uma desintegração, progressiva e ascendente, de toda a estrutura ôntica da nossa existência. No “Antígona” de Sófocles é-nos dito que «muitas coisas grandiosas vivem, mas nada é superior ao homem em majestade». Já Protágoras afirmava que «o homem é a medida de todas as coisas». Também no livro dos Génesis, Deus vê que toda a criação é boa, mas quando cria o homem reconhece que toda a criação era «muito boa» (cf. Gn 1). O homem é este mistério grandioso de bondade e amor. De facto, é triste verificar que esta humanidade não re-conhece os caminhos que anda a trilhar. Pior, não sabe para onde vai. Isto significa que está perdida, sem rumo, desorientada. A este respeito temos dois casos bem elucidativos: nos jovens, a droga; e nos adultos, as rupturas conjugais.

Se não, vejamos o caso da televisão de hoje. A esta não lhe convém ter uma programação que imprima ao telespectador uma experiência profunda, antes querem que o telespectador se distraia, passe bem e não se aborreça, garantindo audiências. Não pretende fomentar as grandes tarefas como educar, ou estimular um tipo de homem mais culto, ou elevar o nível das inquietações do telespectador, mas somente manter as pessoas entretidas. E quando há demasiada concorrência, há que ganhar audiências seja a que custo for. É aqui que entra o sexo, a pornografia, os concursos vulgares e simplistas, as telenovelas e um largo etcétera nesta linha pobre e insubstancial. E o mais grave é que a televisão constitui para a maior parte quase todo o alimento intelectual.

Nesse sentido, ao telespectador do “zapping” interessa tudo e, simultaneamente, nada. Utiliza o “zapping” para relaxar, para se esquecer das suas tensões e problemas do trabalho. O que ele quer é passar o tempo sem mais complicações, tal e qual à mulher dependente das revistas sentimentalistas ou a denominada “imprensa cor-de-rosa”. Esta literatura, se assim a podemos denominar, não impõe nenhum esforço intelectual, já que 90% são fotos e o resto é um texto mínimo ou os pés da foto que substituem as antigas legendas de Banda Desenhada: parecem os «desenhos animados dos adultos» (H. Rojas). Estas pessoas dir-nos-ão: “estas revistas servem para passar o tempo”. E passar o tempo significa, por um lado, que não têm grandes inquietações e, por outro, que não têm grandes ideais.

Alcança-se, assim, um topo desolador e terrível: «a socialização da imaturidade» (H. Rojas). Esta define-se mediante três ingredientes, a saber: desorientação, inversão de valores e um grande vazio espiritual.

Que fazer, então? Há que lutar com todas as forças para vencer esta vida “light”, porque conduz a uma existência vazia. Façamos como o alpinista: escalar exige esforço e um trabalho duro até chegar ao cume; porém, vale a pena. Porque se a vida é concebida como algo adocicado, brando, ou simplesmente concebida desde o ponto de vista hedonista, cometemos, portanto, um grande erro. Na verdade, nem isso é vida, nem isso se pode interpretar assim. Com efeito, há que voltar a recuperar o sentido autêntico do amor à verdade, bem como recuperar a paixão da liberdade autêntica. Ao encontrá-las, encontramos verdadeiramente a presença amorosa e actuante de Deus.


[1] «Homo lupus hominis» (Tomás Hobbes)