domingo, março 02, 2008

A Ignorância de si mesmo como impossibilidade do relacionamento com Deus e com os outros (II)


Como já vimos anteriormente, os “Filósofos das suspeita” e o Liberalismo são a base explicativa para e dos problemas actuais. A isto acresce a ignorância que cada pessoa (ou de cada sujeito) tem de si mesma. Durante o Natal ouvimos dizer que o maior problema da humanidade é a ausência de Deus no coração do homem. Estas palavras foram proferidas pelo Cardeal Patriarca de Lisboa na “Mensagem de Natal” (2007) e que foi transmitida pela televisão. Eu pergunto: será realmente este o maior problema?! De facto, é um problema gravíssimo e que brota das bases ulteriormente mencionadas. Mas, tendo em conta a realidade nacional, será este o problema de fundo? Porquê que é que temos o hábito de falar as coisas de modo tão abstracto? Num sentido abstracto, realmente, este é um problema sério. Mas se nós, porventura, formos capazes de nos conhecermos a nós mesmos não será que encontraremos o devido espaço de Deus no nosso coração? Quanto mais nós nos conhecemos mais Deus se torna presente.
Se eu andar alienado como uma cana que vira consoante o vento, certamente sentirei a ausência de Deus. Mas se eu me conhecer e se fizer um esforço quotidiano nesse sentido, certamente sentirei muito mais a presença de Deus. No entanto, se me conhecer a mim mesmo sob a chefia da fé, então Deus estará sempre presente no meu coração. Se nós, como Igreja, queremos isto mesmo, devemos elaborar uma cuidada pedagogia de educação na fé. Atenção que eu disse na fé (e não da fé). Educa-se sempre na fé. Apesar de tudo ela é um conceito dinâmico, mas porque se trata de um conceito dinâmico ela é pura manifestação de Deus: é um dom de Deus ao homem. João Paulo II (In, Fides et ratio) afirmava que a fé e a razão são as duas «asas» do conhecimento, inseparáveis entre si. Todavia, é possível existir a razão sem a fé, mas o inverso é impossível. A explicação é simples: a fé é, e deve ser sempre, razoável, isto é, a fé em si mesma contém um substrato intelectivo. Pois estou convencido que ninguém me dirá que crê só por crer! Todo o crente afirmará que crê por esta ou por aquela razão: há um substrato racional que nada mais é do que as razões da minha crença.
Daí a importância da Autenticidade. Uma verdadeira e genuína autenticidade implica o conhecimento de nós mesmos. Só deste modo poderemos amadurecer e sermos realmente felizes. É uma felicidade que brota da perfeita relação existente entre nós e Deus, e que nos impele a ver no homem um outro ‘eu’ de mim mesmo: o outro é um alter-ego (alter = outro; ego = eu). Como dizia P. Celan, «eu sou tu quando eu sou eu». Não olhemos o outro apenas numa dimensão filantrópica, pois tal atitude seria redutora. Olhemos, portanto, o outro como um irmão, como um outro ‘eu’ como eu. E, imbuídos pelo espírito cristão de amor e filiação, iremos ver no outro um ser infinitamente amado por Deus como eu, um ser que, tal como eu, é chamado à santidade e vocacionado para a santidade e para a felicidade. Este outro é o irmão. Nós, porventura, não nos tornamos irmãos em virtude do baptismo? Quantas vezes já não ouviram o celebrante (o presidente da celebração) dizer «meus queridos irmãos e irmãs»? Pois bem, neste nosso irmão passa como luz refulgente o rosto de Cristo, o rosto do Infinito, um rosto que espelha o rosto humano e divino de Jesus Cristo. O nosso irmão é sinal e presença de Deus no meio de todos nós.

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